Geneticista Flávio Lewgoy revela que já há vários casos
comprovados no mundo de graves danos à saúde humana e animal provocados pelo
uso de transgênicos. "O que os críticos dos transgênicos sempre disseram
está aparecendo, e em grau exponencial, mostrando que se tratam de produtos de
alto risco", afirmou o cientista à EcoAgência.
Porto Alegre, RS - Um parecer científico da Associação Gaúcha
de Proteção ao Ambiente Natural (Agapan) sobre os Organismos Geneticamente
Modificados (OGMs), dirigido ao Conselho Estadual de Saúde, põe mais lenha na
fogueira desse debate. O texto afirma, com todas as letras, que estão
comprovados os riscos dos transgênicos à saúde humana e animal.
Elaborado pelo químico e especialista em genética Flávio
Lewgoy, ex - professor titular do Departamento de Genética da Universidade
Federal do Rio Grande do Sul (Ufrgs) e conselheiro da Agapan, o documento
destaca que, em 1999, ele já tinha
alertado a respeito do potencial nocivo dos OGMs, como resultado dos genes
alienígenas inseridos em seus genomas.
“Desde então, pesquisas científicas em renomadas instituições
de vários países, bem como relatos de casos, evidenciam que esse potencial se
concretizou, em alto risco à saúde pública e animal, com a liberação comercial
de variedades Geneticamente Modificadas de soja e milho sem avaliação
adequada”, afirma Lewgoy.
A seguir, ele enumera no documento de quatro páginas, com a
citação das fontes científicas, vários exemplos disso. Tais pesquisas, observa,
foram publicadas em periódicos científicos internacionais, de reconhecida
seriedade, após rigorosa revisão por painéis de especialistas da mesma área – o
chamado “peer review”. “Os artigos
expõem anomalias na bioquímica, sistema imune, anatomia, crescimento,
reprodução e comportamento em animais aliementados com batatas, milho ou soja
geneticamente modificados”, assinala Lewgoy.
Pesquisas com roedores
São impressionantes, por exemplo, os resultados citados de
pesquisas com roedores alimentados com transgênicos.
No Rowett Institute, em Aberdeen, Escócia, roedores jovens
alimentados com a batata transgência mostraram, após 110 dias, lesões
pré-cancerosas no aparelho digestivo, limitado desenvolvimento do cérebro, fígado,
testículos, pâncreas, intestinos dilatados e danos no sistema imune, relataram
os cientistas Puztai e Ewen, autores do estudo.
Já a doutora Irina Ermákova, da Academia de Ciências da
Rússia, publicou que ratas alimentadas com soja RR (tolerante ao herbicida
glifosato, liberada no Brasil) tiveram excesso de filhotes malformados e com
pouca sobrevida: os sobreviventes eram estéreis. Além disso, num comunicado ao
14º. Congresso Europeu de Psiquiatria, ela advertiu ainda que a mesma dieta
elevou os níveis de ansiedade e agressividade dos roedores.
Com resultados bem semelhantes, cientistas das universidade
de Urbino, Perguia e Pavia, na Itália, revelaram que a alimentação de
camundongos com soja RR provocou alterações no pâncreas, fígado e intestino dos
roedores.
Reações humanas ao algodão, milho e soja
Na Índia, em seis aldeias, os trabalhadores de plantações do
algodão Bt (transgênicos) tiveram afecções de pele, olhos e aparelho
respiratório. Detalhe importante: todos tinham, anteriormente, trabalhado com
algodão não geneticamente modificado (convencional), sem apresentar esses
problemas de saúde.
Em outro caso relatado por Lewgoy, nas Filipinas, em 2003,
cerca de 100 pessoas que viviam perto de uma plantação de milho Bt Mon810
tiveram reações cutâneas, intestinais, respiratórias e outros sintomas quando o
milho começou a florescer. “Testes do sangue de 39 pessoas acusaram a presença
de anticorpos contra a toxina Bt, o que reforça a suposição de que o pólen
seria a causa do episódio. Esses sintomas reapareceram em 2004, em ao menos
quatro outras localidades onde foi plantado o mesmo cultivar de milho”.
Já na Grã-Bretanha verificou-se um grande aumento nas
alergias à soja após a introdução do produto GM. “Em 1999, em curto espaço de
tempo, alergias causadas pelo consumo de soja tiveram um salto na incidência de
10% para 15%”.
A soja geneticamente modificada foi introduzida justamente
naquele ano no país. E os testes sangüíneos para anticorpos revelaram reações
diferentes das pessoas a variedades de soja não-transgências e transgênica (que
tem maior concentração de uma proteína alergênica, por “coincidência”).
Mortes de animais
Após a colheita do algodão, no distrito de Warangal, em
Andhra Pradesh, Índia, 10 mil ovelhas que pastaram folhas e brotos das plantas
transgênicas adoeceram e morreram em cinco a sete dias, conta o geneticista. A
causa provável apontada foi a a toxina Bt (do produto transgênico), sendo que
não houve mortes de ovelhas nos campos de algodão não-Bt.
Enquanto isso, em Hesse, Alemanha, doze vacas leiteiras de um
rebanho, alimentadas com folhas e sabugos de milho Bt 176, duplamente
transgênico, resistente ao herbicida glufosinato e secretor da toxina Bt,
morreram. A Syngenta, fornecedora das sementes pagou 40 mil euros de
indenização ao fazendeiro, mas as amostras coletadas para exames de laboratório
sumiram, misteriosamente.
Por outro lado, em fazendas dos Estados Unidos constatou-se
que, entre ração transgênica e não-transgênica, os animais preferem a última:
“Em testes feitos em fazendas, vacas e porcos repetidamente rejeitaram milho GM
Bt. Animais que evitaram alimentos GM (soja RR, milho Bt) incluem vacas, porcos,
gansos selvagens, esquilos, veados, alces, ratos e camundongos”, destaca o
parecer.
Crítica à CTNBio
Quando aprovou a liberação comercial do milho transgênico da
Bayer (resistente ao herbicida glufosinato), recentemente, a Comissão Técnica
Nacional de Biossegurança (CTNBio) afirmou que a espécie não é potencialmente
causadora de degradação ao meio ambiente ou de prejuízos à saúde humana e
animal. “Esta afirmação não se sustenta nos fatos”, critica o cientista gaúcho
e conselheiro da Agapan.
Segundo ele, as duas únicas pesquisas publicadas a respeito
foram duramente criticadas por pesquisadores independentes por serem mal
elaboradas, mas mesmo assim detectaram problemas no uso do produto. Um
experimento com galinhas, cita Lewgoy, mostrou que as aves alimentas com ração
de milho geneticamente modificado tiveram o dobro da mortalidade, além de menor
ganho de peso. A segunda experiência empregou a proteína PAT, que o milho
transgênico sintetiza, e filhotes de ratos alimentados por 13 dias com baixas
ou altas doses da proteína tiveram problemas de crescimento.
Além disso, completa, são muito reduzidos ou inexistentes os
estudos sobre a digestão no organismo humano e animal do herbicida e seus
metabólitos (empregados na planta e na espiga transgênica), bem como sua
interação com os microorganismos do aparelho digestivo.
Riscos preocupantes
“Os riscos de saúde, humanos e animais, do consumo de
transgênicos agrícolas, expostos e documentados neste parecer, imediatos – por
exemplo, alergias – e a médio e longo
prazo, afetando os sistemas nervoso, digestivo e imune, são preocupantes”,
afirma o geneticista.
Na conclusão do documento, ele recomenda que seja exigido o
cumprimento da lei que determina a rotulagem dos produtos transgênicos
disponíveis aos consumidores. Orienta também para que o Conselho Estadual de
Saúde do Rio Grande do Sul e dos demais estados e municipios tomem medidas
judiciais para impedir o licenciamento e liberação comercial dos transgênicos
que não tenham passado por rigorosas avaliações, feitas por cientistas
independentes, declaradamente sem conflitos de interesse, ressalta.
“Os defensores dos transgênicos estão ficando acuados, os
fatos sinalizam que alguma coisa há de errado. Estamos na véspera de grandes
acontecimentos para derrubar os mitos dos transgênicos, que só existem pelas
enormes quantias que as empresas do setor investem”, disse Lewgoy à EcoAgência.
Genoma é muito complexo
O geneticista destaca que o genoma é extremamente complexo,
por isso é impossível aos cientistas que trabalham na produção de transgênicos
controlar todos os seus efeitos.
Para ele, estes fatos todos só não têm vindo à público por
omissão da imprensa e cumplicidade de boa parte dos cientistas, alguns ingênuos
– acreditando que ser contra os transgênicos é ser contra a ciência – e outros
silenciados ou pagos pela indústria. Mas dois cientistas brasileiros já
abandonaram a CTNbio por não concordarem com os procedimentos do órgão na
avaliação dos OGMs, lembra.
Por estranho que pareça, destaca, há muitos cientistas
norte-americanos contestando os OGMs e que estão sofrendo represálias por isso:
“O poder financeiro dessas empresas é estarrecedor, mas não estão conseguindo
mais tapar o sol com a peneira, há uma série de denúncias contra os
transgênicos, estamos vivendo outros tempos”, acredita o cientista.